domingo, 22 de agosto de 2010

Blood Money

Plataforma analisada: Amiga
Também disponível para: Atari ST, Commodore 64, IBM PC (DOS, EGA)
Lançamento: 1989
Desenvolvedora: DMA Design
Distribuidora: Psygnosis
Mídia original: 2 disquetes de 880kb
Gênero:
nave (shmup)



Em 1990 o Amiga era o microcomputador do momento. Representante máximo da geração de computadores domésticos de 16 bits (o Atari ST nem chegava perto), ele era uma amostra do que seria o normal anos mais tarde no PC. Claro, quem tinha um conhecido com Amiga era logo de cara apresentado a uma seleção de demonstrações gráficas e jogos com o melhor da plataforma. Entre eles, invariavelmente estava Blood Money. Eu não fui exceção e confesso, quando eu vi o jogo a primeira vez pensei: "tenho que ter um Amiga". Claro, com 15 anos na época isso se traduzia em "meu pai tem que me dar um Amiga".
Produzido pela (na época) novata DMA Design (que virou a Rockstar North), distribuído pela Psygnosys (mais tarde virou Sony Computer Studios Livervpool) e capa desenhada pelo Roger Dean (sim, o das capas dos álbuns do Yes), a premissa do jogo é extremamente simples. O jogador (ou jogadores no modo cooperativo) são convidados para um safari espacial em quatro planetas diferentes, começando com 200 créditos no bolso para encarar a aventura. Cada planeta tem um custo de acesso (de 100 a 400 créditos) e um ambiente específico. Um planeta mecanizado, um submarino, um de gelo e, finalmente, um planeta aparentemente vivo, pela quantidade de olhos e bocas no cenário. Claro, cada ambiente tem seus inimigos próprios e temáticos, com uma variação bastante grande que chamava a atenção. Na final de cada fase longa, um chefão testava o jogador para se prosseguir a aventura. Cada inimigo derrotado deixa para trás uma moeda que valem créditos, que podem ser trocados por armas e comprar o acesso aos outros planetas. 



Tecnicamente falando, Blood Money é um dos melhores jogos do Amiga em 1989, só ficando atrás de Shadow of the Beast (falo dele mais tarde, pode deixar). O primeiro disco tinha apenas o código do jogo e uma abertura caprichadíssima para os padrões da época. Pouco perto do que se faz hoje, mas bastante se considerar que na época o supra-sumo era o PC Engine com o CD-ROM², que nem era tão melhor, já que o PC Engine era fraquinho perto do Amiga. Era hipnotizante ver os meteoros se aproximando na tela enquanto a navezinha ficava passeando pela tela ao som de uma música 100% digital (MOD, claro) do David Whittaker (um dos papas da música de jogos europeus da época). Ao encerrar a abertura, o jogo pedia para inserir o disco 2, que continha os dados das fases e o final do jogo.


A abertura. Impressionante na época e nostálgica nos dias de hoje.


Dentro do jogo, o aspecto técnico não ficava para trás, a escolha dos efeitos sonoros foi acertadíssima, o único pecado era a música que ficava repetitiva depois de um tempo. Graficamente, Blood Money é impecável para justificar as 24 Libras do preço de lançamento. Cada inimigo é muito bem detalhado e cuidadosamente animado. Alguns inimigos mais complexos chegavam a ter 24 quadros de animação, de acordo com entrevistas com os programadores na época. Enfim, se pegarmos os jogos do NES, PC EngineMegadrive da época, as qualidades técnicas ficam para lá de óbvias.



Só que os elogios acabam por aqui. O jogo em si é ordinário ao extremo. É até fácil criticar Blood Money, já que, em praticamente todos os aspectos, o jogo é um desastre. A dificuldade é absurda. Tem gente que fala da dificuldade da era 16 bits com certo orgulho, mas tenha certeza, não é essa a dificuldade de Blood Money. O jogo é torturantemente difícil e só conheço uma pessoa que alega ter terminado sem truque de invulnerabilidade, coisa que até hoje tenho dúvidas. O primeiro problema grave é o sistema de energia e colisão. O jogador tem uma barra de energia e três vidas, só que ao colidir com algo (inclusive o cenário) a energia é rapidamente drenada. Isso mesmo, ao invés de perder um ponto de energia e ficar invulnerável por um instante para o jogador se recuperar, a energia era drenada a cada quadro de animação. Em menos um segundo de contato a vida estava esgotada, o que era muito irritante, já que elementos para colidir existem em abundância.




A idéia de coletar as moedas que os inimigos deixam para trás ao serem destruídos é legal, mas a execução é péssima. Ao invés das moedas ficarem flutuando no local onde o inimigo foi destruído, as moedas caem e, muitas vezes, é impossível pegá-las, já que no meio de muitos inimigos ou próximo ao chão não sobra muito tempo e espaço de manobra. Inicialmente, os tiros do jogador tem alcance limitado, enquanto os dos inimigos não tem o menor problema em atravessar a tela por completo, inclusive através do cenário. Mesmo inimigos atravessam incólumes o cenário mortal ao jogador. Isso vira um problema grave porque o jogo muitas vezes possui corredores estreitos para passar, inclusive em zig-zag, e obviamente fica difícil desviar das paredes, inimigos e tiros em muitos desses locais. Em contraste, os chefões eram frouxos, ou o jogo dava essa impressão depois de longos minutos de tortura com inimigos comuns maleficamente colocados no cenário.




Para não dizer que o jogo padece de boas idéias, uma era deveras curiosa e divertida (até certo ponto). Era possível comprar armas com os créditos ganhos, só que existe um item de cada no jogo. No modo de 2 jogadores, isso queria dizer que apenas um dos jogadores poderia usar aquele upgrade, o que balancearia um pouco a coisa se o jogo fosse bem equilibrado. Como não era o caso, desperdiçaram uma boa idéia.
Dava para melhorar o jogo? Se mudassem o sistema de energia e colisão, além de fixar as moedas obtidas no cenário, o jogo ainda seria bastante desafiante, mas passaria a ser possível. Se os tiros do jogador pudessem atravessar de um lado ao outro da tela logo de início e o cenário fosse sólido para todos, isto é, nem inimigos e tiros atravessassem o cenário, Blood Money seria um jogo provavelmente divertido. Não cheguei a testar, mas diz a lenda que a versão do Commodore 64 sanava os problemas graves do original do Amiga, mas como esta foi feita por outra equipe, não chega a me assustar a hipótese. Nunca vi a versão PC DOS, mas com gráficos EGA, som Adlib e a possibilidade dos problemas da versão Amiga se repetirem, não é animador sair procurando o jogo.

Longplay com todas as fases.

O curioso é que a DMA Design não é exatamente uma produtora com carreira medíocre. Depois de Blood Money, ela lançou Lemmings, que virou febre e foi lançado em todas as plataformas possíveis e imagináveis na época (e até hoje em dia). Mais tarde, o David Jones, criador e programador do Blood Money, criou o Grand Theft Auto e, mais recentemente, Crackdown e All Points Bulletin. Enfim, uma pedra no caminho desse pessoal que ainda estava aprendendo a fazer jogos do jeito certo.

O que tem de bom:

  • Gráficos que mostravam do que o Amiga era capaz na época.
  • Som na medida, com bons efeitos sonoros e uma música, que apesar de ser repetitiva, davam conta do recado.
  • Abertura inimaginável na época.
O que não ficou lá essas coisas:
  • Tudo depois da abertura. A lista é tão longa que é mais fácil dizer que o que presta ficou na seção anterior.
Avaliação 21 anos depois: veja a abertura e, se tiver curiosidade, jogue com invulnerabilidade. Se você estiver num daqueles dias, achando que tudo está ruim, jogue sem invulnerabilidade e veja que tudo pode ficar pior.

Como jogar: se depois disso tudo você ainda tem curiosidade, uma vez encontrado o jogo, você pode usar o Ubiquitous Amiga Emulator, tendo versão para Ubuntu disponível no Synaptic além de, claro, para Windows. O Kickstart (versão 1.3 ou superior), a ROM do sistema, ainda tem direitos autorais, sendo vendida no pacote Amiga Forever, (tem opção barata de 10 dólares, bem menos que um Amiga real no eBay), ou então tem que apelar pra cara de pau e achar no Google mesmo. Mas francamente, é muito trabalho por pouco, vale a pena ver o vídeo no Youtube e fim.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Aleste

Plataforma analisada: MSX 2
Também disponível para: Sega Master System, Wii (Virtual Console Japonês)
Lançamento: 1988
Distribuidora: Compile
Mídia original: cartucho MEGAROM de 2Mbits (256kb) 
Gênero: nave (shmup)
Já conhecida pelos MSXzeiros da época como a produtora de Zanac, um dos melhores jogos de nave para o primeiro MSX, a Compile lançou Aleste em 1988, o jogo que pode ser considerado um divisor de águas para os jogos de nave na plataforma MSX. O roteiro é genérico, o computador de manutenção ambiental DIA-51 é atacado por uma planta (?!)  e toma conta de tudo, liberando plantas mutadas geneticamente que destroem tudo pelo seu caminho. Na explosão em que isso ocorre, Yuri, a namorada de Ray Wizn, é ferida gravemente. O que as plantas provavelmente ignoravam é que o Ray é o piloto da nave experimental Aleste, que decola apressadamente para impedir o domínio das plantas e, claro, mostrar com quantos paus se faz uma canoa.
Abertura e as plantas que "fogem".
Roteiro nunca foi o forte de nenhum shmup, ignorado esse detalhe, Aleste oferece o que há de melhor na plataforma em 256kb de ROM. Gráficos em Screen 5, suporte aos chips de som PSG (padrão na plataforma) e ao MSX Music (o FM PAC), ação frenética e nível de dificuldade auto-ajustável de acordo com a habilidade do jogador. A nave conta com um canhão padrão e uma arma extra de uso limitado, que pode ser escolhida entre 8 disponíveis no jogo. Tanto o canhão padrão como a arma extra podem ser melhorados, o que deixa o jogador num dilema curioso: quanto melhor o armamento, mais difícil fica o jogo. Mas não existem recargas explícitas da arma extra no jogo, ela recarrega automaticamente ao fazer um power up. Também conta o fato de que ao pegar qualquer power up (arma padrão ou extra) deixa a nave invulnerável por um breve momento. Então o jogador normalmente *QUER* power ups, mas tem que planejar o ritmo em que isso ocorre para que a coisa não fique muito ruim para o lado dele.
Tela título. Aperte as teclas A, L, E, S, e T ao mesmo tempo para ouvir as músicas.
Aleste é historicamente importante para a plataforma MSX 2 por ter sido lançado em um ponto de virada no interesse das produtoras. Apesar do sucesso da linha MSX no Japão, o MSX 2 demorou para decolar como plataforma de jogos. Mesmo grande produtoras, como a Konami, tinham um pé muito firme na produção de conteúdo para o MSX original, visto que toda a série Gradius na plataforma é para esta plataforma. Apenas Episode II tem um suporte adicional para MSX 2, que nem é lá essas coisas. Aleste mostrava claramente as vantagens em se desenvolver um jogo para o MSX 2, como mais memória RAM (64kb no mínimo, contra 8kb mínimos no MSX original) e chip de vídeo mais poderoso que gerava sprites multicoloridos e scroll suave. Aleste simplesmente foi um dos primeiros (se não for o primeiro mesmo) jogos de nave de MSX 2 que não poderiam ser feito em um MSX original com gráficos simplificados.

Capa da versão do Mark III.
Além do MSX, Aleste também foi lançado no Sega Mark III, o Master System ocidental. No ocidente ele foi rebatizado de Power Strike, sendo vendido nos EUA exclusivamente via correio, numa edição bastante limitada e difícil hoje de se conseguir. Na Europa e Austrália o jogo foi vendido normalmente em lojas. O jogo ganhou diversas sequencias, diretas ou não. Ainda no MSX 2, temos Aleste 2 e Aleste Gaiden, que marca o primeiro jogo da série com personagens humanóides (robôs no caso), uma tendência que é forte mesmo hoje em jogos como Shikigami no Shiro ou Gundemonium. Os videogames da SEGA também tiveram Aleste no Game Gear e Musha Aleste no Megadrive, além de uma continuação para Mega CD. O Super Famicom (SNES) teve, provavelmente, o mais refinado dos jogos com Super Aleste, ou Space Megaforce nos EUA.
Estágio 1 do jogo.
A trilha sonora do jogo é um dos destaques, tirando proveito do chip MSX Music, um chip YM2413 da Yamaha para sintetização FM, baseado no padrão OPL, que viria a ser bastante conhecido nas placas Adlib e Soundblaster para PC (nota: o MSX Music é de 1984, vanguarda mesmo). A trilha possui variações entre o eletrônico e o new age, uma mistura bastante conhecida pelos jogadores da série, mas ainda não ia ao extremo do que a plataforma poderia oferecer, coisa que só foi feita em Aleste 2 (falo dele mais tarde). Para quem quiser ouvir as músicas do jogo, basta na tela de tpitulo do jogo pressionar simultaneamente as teclas A, L, E, S, e T.

Jogos como Aleste também são interessantes de se lembrar por serem a última geração de jogos arcade produzidos em massa para computadores pessoais, sejam eles de 8 ou 16 bits. Nesta época, o Famicom (NES) já dominava o mercado japonês e o interesse das produtoras estava migrando para esta plataforma, ao PC Engine (Turbografx 16) e  ao Megadrive. Quem jogou no início dos anos 90 deve lembrar claramente da diferença dos mercados de jogos para videogame e para PC, enquanto que em plataformas um pouco mais antigas, como o MSX, Amiga e Spectrum, essa diferença não era tão clara.

O que tem de bom:
  • Gráficos competentes para a plataforma.
  • Boas músicas, mesmo no chip PSG, o padrão mais simples da plataforma.
  • Dificuldade ajustável ao jogador.
O que não ficou lá essas coisas:
  • Derrotar os chefões dentro do tempo limite ridículo para avançar para a próxima fase. O penúltimo tinha 8 segundos e, por favor, era complicado. Se acabasse o tempo recomeçava a fase, me lembro de ter feito mais de 3 vezes a fase 7 para acabar o jogo.
  • Ainda não sabiam usar bem os sprites do MSX 2. Chegava a doer os olhos com o flicker de metade dos sprites na tela (sério, era grave assim).
  • O efeito sonoro de alguns tiros era irritante, mesmo no MSX Music.
Avaliação 22 anos depois: jogos de nave não são exatamente um gênero que avançou tanto na mecânica, então Aleste continua tão bom de se jogar hoje como no seu lançamento. As possíveis reclamações de um usuário moderno seriam os gráficos, hoje bastante datados e com pouca variação, algo que foi sanado apenas na continuação e, ainda assim, parcialmente. A dificuldade auto-adaptativa do jogo o deixa bastante interessante, oferecendo um desafio crescente até o ponto em que se torne realmente bom no jogo. Se você é fã de jogos de nave, não pode deixar de jogar esse clássico.

Como jogar: use a ROM disponível no ROM World com o OpenMSX no Linux, meu emulador favorito de MSX, ou no BlueMSX se você usa Windows. Cuidado, o jogo é abandonware, então não posso afirmar que é legal distribuir essa ROM. Se você tiver um Wii e usar o serviço Virtual Console japonês, dá para comprar legalmente esse jogo lá.