sexta-feira, 16 de julho de 2010

Adventure

Plataforma analisada: Atari 2600
Lançamento: 1979
Distribuidora: Atari
Desenvolvedor: Warren Robinett
Mídia original: Cartucho de 4kB
Gênero: aventura, RPG de ação


Sua missão: trazer o cálice encantado para o castelo dourado. Como todo RPG de ação, uma premissa simples dá o tom da aventura. A dificuldade? Encontrar as chaves que abrem os outros castelos, fugir/matar os três dragões e evitar o morcego ladrão, que toma o que é seu e te deixa com outra coisa, inclusive um dragão vivo e pronto para te devorar. O impressionante? O ano é 1979 e o sistema, o Atari 2600. Nascia ali o gênero de RPG de ação, em meros 4kb de ROM e 128 bytes de memória. Inspirado pelos clássicos jogos de aventura em texto, feitos normalmente para mainframes com poder de processamento muito maior que o do Atari 2600, Adventure foi feito por Warren Robinett, um empregado da Atari que recebeu ordens explícitas do chefe para não perder tempo tentando converter Colossal Cave Adventure, de Will Crowther e Don Woods. Um milhão de cópias vendidas e o 7º jogo mais vendido de Atari 2600 de todos os tempos, é certo que alguém definitivamente enxergava mais longe.
O jogo consiste em três áreas de interesse, os castelos dourados, vermelho e preto. À exceção do dourado, os demais castelos possuem catacumbas (labirintos, na verdade), na qual o jogador deve procurar os itens de interesse: a espada, que pode matar os dragões, a ponte, que pode criar atalhos nos labirintos, o cálice e o ímã, que atrai objetos. Como obstáculos, três dragões com cara de patos (sério) e um morcego ladrão. Os castelos em si são ligados por catacumbas, fazendo com que a dificuldade inicial seja desvendar o caminho para chegar de uma parte a outra do jogo. Claro, com os dragões à solta, ficava complicado fazer isso na dificuldade mais alta.
Em termos de dificuldades, o jogo tinha três. Uma mais simples, na qual bastava cruzar uma catacumba no castelo preto para achar o cálice e com apenas dois dragões. Essa era a dificuldade 1. Na segunda dificuldade, o jogo possuía todos os elementos (inclusive o dragão vermelho) e a localização dos objetos era fixa. Na terceira dificuldade, a localização de todos os itens é aleatória, o que tornava o jogo muitas vezes impossível, já que a chave de um castelo poderia acabar presa dentro do próprio castelo.
Os dragões, além de possuírem cores diferentes, possuíam comportamentos diferentes. Não era simplesmente perseguir e devorar o jogador, eles poderiam proteger itens ou ajudar uns aos outros. Yorgle, o dragão amarelo, tem medo da chave dourada e protege o cálice quando o encontra (isto é, pára de perseguir o jogador pelas telas nessa hora), ou então ajuda os outros dragões a proteger os seus itens. Grundle, o dragão verde, protege o ímã, a ponte, a chave preta e o cálice. Finalmente, Rhindle, o dragão vermelho, protege o cálice e a chave branca, além de ser o dragão mais rápido. 

Além das limitações do hardware do Atari 2600, Adventure precisou quebrar barreiras incomuns para videogames na época. Em geral, os jogos do Atari eram 2D clássicos, como jogos de plataforma, nave ou corrida. Adventure levou aos videogames domésticos o mundo até então reservado as aventuras texto, gênero que inclusive teve bons exemplos feitos no Brasil, como Amazônia (Renato Degiovani, TK-90X, MSX e PC), A Lenda da Gávea (Luiz F. Moraes, TK-90X e MSX) e Matagal (Bucaneiros, MSX). Nestes jogos, uma interface texto (comum em mainframes) descreve o ambiente, lista objetos e permite que o usuário dê comandos, interaja com objetos em sua posse e com outros no ambiente, etc. Para resolver este problema, o mundo foi apresentado como telas nas quais o jogador poderia se deslocar usando o controle, eliminando assim a descrição "Você está diante do castelo dourado" por uma imagem do próprio castelo. A mudança de um ambiente para outro era feito quando o jogador encostava no canto da tela e ia em direção à próxima. O jogador pode carregar um item por vez, tocando no item e encostando-o nos objetos interativos. Assim, era possível abrir o portão do castelo encostando a chave nele, ou então matar um dragão encostando a espada nele. Claro, isso hoje é óbvio e jogos como Zelda repetiram a fórmula a exaustão, mas em 1979 isso tudo era novidade.
Outra coisa que não era comum e que provavelmente apareceu pela primeira vez em Adventure é a idéia do "continue". Ao morrer, o jogador poderia acionar a chave reset e todos os itens do jogo continuariam no seu lugar atual e os castelos continuariam abertos, com a penalidade de que os dragões mortos também voltariam a vida.
Por fim, Adventure também é conhecido por introduzir em videogames o conceito de easter eggs, óvos de páscoa, ou mais correto em português, surpresas escondidas. Na época, a Atari não dava créditos aos seus programadores (o que levaria muitos deles formarem a Activision mais tarde), então o Warren Robinett resolveu colocar seu nome escondido nos gráficos do jogo em uma sala secreta, acessível apenas com um item invisível (a mesma cor do chão, na verdade) escondido nas catacumbas do castelo preto.
Como curiosidade, o Robinett tinha um salário anual de US$22000, enquanto que a Atari vendeu um milhão de cópias de um jogo que custava US$25 ao consumidor. Isso explica a "revolta do chantili" em esconder o seu nome no jogo, algo que a Activision colocava numa página do manual do jogo, uma diferença na valorização do profissional desenvolvedor de jogos próxima a de um diretor de cinema ou ator. Hoje em dia, o Robinett é professor do departamento de Ciência da Computação na Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill , além de ter trabalhado em projetos de realidade virtual com a NASA.

O que tem de bom:
  • O conceito imortal de pegar um objeto tocando nele.
  • Abrir o portão do castelo com a chave certa. Metal Gear anyone?
  • Enfrentar dragões com uma espada em punhos.
  • A idéia de ter um objetivo finito e palpável, com múltiplas variações em como realizá-lo. Esse jogo é pai do replay value.
  • Somente temos Zelda por conta do Adventure.
O que não ficou lá essas coisas:
  • Os gráficos são muito fracos, mesmo levando em consideração as limitações do Atari 2600.
  • Os patos, quero dizer, os dragões, são medonhos.
  • O som é praticamente ausente e, quando dá o ar da graça, é com sons irritantes.
Avaliação 31 anos depois: francamente, o jogo não envelheceu bem. Os gráficos são descartáveis e somente são aceitáveis porque o jogo é histórico. Considerando-o dessa forma, temos uma aventura bastante rápida de ser vencida por um jogador com um pouco de experiência em jogos modernos. Infelizmente o bug do posicionamento dos objetos no terceiro nível de dificuldade torna o jogo frustrante no único modo que poderia garantir uma diversão prolongada nos dias de hoje. Se você não se incomodar com isso, o terceiro nível de dificuldade garante a diversão por um tempinho, o suficiente para você rir dos patos, quero dizer, dos dragões.

Como jogar: no site oficial da Atari (dica do Bruno Campagnolo, valeu), ou numa versão online em Java. A versão Java, obviamente, requer o plugin do Java. Além disso, dá para usar o Stella, emulador de Atari, e jogar a ROM em um dos muitos pacotes disponíveis online. Vale lembrar que o jogo é abandonware, mas ainda tem direitos autorais válidos nos dias de hoje.